Duplo Etérico: Conceito Espírita ou Não?

 

O conceito de duplo etérico é controverso no meio espírita. Ele aparece em obras de autores respeitados como André Luiz, além de outros. Porém, “duplo etérico” não é um conceito espírita, isto é, não foi definido por Kardec ou os Espíritos.

Na verdade, “duplo etérico” é um conceito esotérico. Ele é chamado de “Linga Sharira” e significa “na teosofia, o 3º princípio na constituição setenária do homem, que é levemente mais etéreo que o corpo físico (sthula sharira). Segundo a Teosofia, ele permeia todo o corpo humano, sendo um molde de todos os órgãos, artérias, e nervos”.[1] É fácil encontrar na internet definições, funções e interpretações diversas (e supostamente espíritas) para o duplo etérico.

Ora se diz que o duplo etérico é um tipo de filtro de energias ou fluidos; ora se diz que ele é o perispírito do encarnado que contém fluido vital; ora se diz que é um corpo vital (outro termo não definido pelo Espiritismo); ou, ainda, que represente ou se manifeste através da aura; que ele é responsável pela vitalização da matéria; que é responsável por administrar as energias vitais etc.

Um problema sério com essas definições é que elas são divulgadas como se fossem conceitos científicos, avançados e modernos quando, na verdade, carecem de base tanto científica quanto espírita, e demonstram desconhecimento a respeito da natureza dos fluidos. Por exemplo, o que são energias vitais para se afirmar que existe um corpo espiritual que administra essas energias? Ou o que seria um corpo vital? Há quem diga que André Luiz afirma que o duplo etérico é o corpo vital. Mas se não sabemos ainda o que é, de fato, o duplo etérico, qualquer definição desse tipo se torna vazia e redundante.

Na Doutrina Espírita, o termo “duplo etérico” aparece uma única vez n’O Livro dos Médiuns (LM).[2] Ao analisar a visão que uma senhora teve de um senhor que a visitou durante o período em que estava enferma e, em particular, buscando compreender a descrição que ela fez do senhor que, na visão, portava uma caixa de rapé (item 116 do LM), Kardec supõe (item 126 do LM) que “possivelmente, aos corpos inertes da Terra correspondem outros, análogos, porém etéreos, no mundo invisível; de que a matéria condensada, que forma os objetos, pode ter uma parte quintessenciada, que nos escapa aos sentidos”.

Com o fito de desvendar essa questão e os mecanismos de outros fenômenos de efeitos físicos, como a escrita direta, Kardec apresenta uma série de questões ao Espírito São Luís (item 128 do LM). Em particular, na questão 4 do item 128 do capítulo VIII do LM, Kardec usa o termo “duplo etérico” da seguinte forma:

4ª Dar-se-á que a matéria inerte se desdobre? Ou que haja no mundo invisível uma matéria essencial, capaz de tomar a forma dos objetos que vemos? Numa palavra, terão estes um duplo etéreo no mundo invisível como os homens são nele representados pelos Espíritos?

 

“Não é assim que as coisas se passam. Sobre os elementos materiais disseminados por todos os pontos do espaço, na vossa atmosfera, têm os Espíritos um poder que estais longe de suspeitar. Podem, pois, eles concentrar à sua vontade esses elementos e dar-lhes a forma aparente que corresponda à dos objetos materiais.”

Da forma como Kardec faz a pergunta, é fácil perceber que ele considerava o conceito de “duplo etérico”, como a simples existência de um segundo corpo de natureza fluídica, assim “como os homens são nele representados pelos Espíritos”. A ideia do homem ser uma criatura que possui dois corpos (físico e perispírito) e, por isso, duplo, pode ser verificada nas seguintes palavras de Kardec na Revista Espírita de 1864[3]:

Quando a alma está unida ao corpo durante a vida, tem um envoltório duplo: um pesado, grosseiro e destrutível, que é o corpo; outro fluídico, leve e indestrutível, chamado perispírito. O perispírito é o laço que une a alma ao corpo; é por seu intermédio que a alma faz o corpo agir e percebe as sensações experimentadas pelo corpo.

 

ALEXANDRE FONTES DA FONSECA -a.f.fonseca@bol.com.br -Campinas, SP (Brasil)

[1] Tirado do link da Wikipedia: http://pt.wikipedia.org/wiki/Linga_sharira.

[2] A. Kardec, O Livro dos Médiuns, Editora FEB, 62ª Edição, Rio de Janeiro (1996).

[3] A. Kardec, “Resumo da Lei dos Fenômenos Espíritas”, Revista Espírita Jornal de Estudos Psicológicos 4 (Abril), pp. 147-156 (1864); FEB: Tradução de Evandro Noleto Bezerra.