Cegos do Espírito

Um dia desses tivemos a oportunidade de vivenciar algo fora do comum.

Ao sairmos do trabalho profissional, no final do expediente diário, seguíamos pelo caminho rotineiro quando vimos que um jovem adulto vinha pela calçada, em sentido contrário ao nosso e em leve corrida, sorrindo largamente e mantendo a mão meio que levantada lateralmente de forma a sentir a vegetação que cobre o alambrado que circunda um condomínio de apartamentos.

Aos nossos olhos aquele rapaz demonstrava uma alegria toda especial.

Mas, o que há de fora do comum em tudo isso? Simples, aquele jovem é cego. Completamente cego. É bem verdade que fazia uso de sua bengala, e também é evidente que já conhecia o caminho, uma vez que reside nas proximidades, conforme constatamos posteriormente. Mas não deixa de ser uma experiência incomum, e os questionamentos são inevitáveis.

Por que um cego tem a coragem de correr, quando nós, que enxergamos, temos preguiça de nos exercitar para manter o corpo saudável?

Por que um cego enche-se de alegria vencendo seus desafios, quando nós, que enxergamos, temos dificuldades para sairmos de estados depressivos causados pelos obstáculos que se apresentam em nossos caminhos?

Por que um cego confia plenamente nos seus sentidos convivendo na escuridão, e nós, que enxergamos, não acreditamos em nossas potencialidades e nas possibilidades positivas da vida?

Simples. Aquele jovem cego enxerga a vida, e nós que enxergamos muitas vezes não a vemos. E não a vemos por vários motivos. Os conceitos e preconceitos, os valores, os medos e as preferências pelo pessimismo e pela descrença, nossas vontades e desejos, quase sempre distanciados dos valores espirituais superiores fazem com que enxerguemos o mundo à nossa maneira, impedindo o máximo aproveitamento da vida que temos, mantendo-nos sintonizados com mentes menos felizes do plano espiritual.

É uma questão de conscientização espiritual. De preferência pelas atitudes a serem tomadas. De posicionamento pessoal diante da vida.

Cada um de nós tem nas mãos o de que é necessário para desenvolver o seu próprio programa reencarnatório, e será muito mais fácil se optarmos pelos sentimentos superiores.

Alguém poderá contrapor dizendo que não é fácil uma mudança íntima.

Concordamos, mas é preciso raciocinar.

Ninguém pode se dizer ignorante quanto às Leis que regem a Sociedade Humana para justificar um crime, qualquer que seja ele. Com a Lei Natural também é assim. Já não podemos justificar nossa situação tão somente pelo prisma com o qual olhamos e agimos diante da vida. As Revelações se sucedem trazendo os esclarecimentos necessários aos nossos espíritos, e se não os conhecemos é pela inércia e imprevidência pessoal, e a Terceira Revelação, personalizada pela Doutrina Espírita, nos orienta quanto à reflexão sobre nossos atos praticados, que refletem nossas aptidões e tendências, justamente para que nos recondicionemos quando forem negativos, ou os reforcemos quando positivos.

Nascemos na carne para mudar, e mudar a nós mesmos. Tanto isso é verdade que, Allan Kardec nos esclarece que o verdadeiro espírita será aquele que se esforçar para mudar suas más inclinações. O esforço, a repetição, a entronização de novos valores, sustentados na lógica imbatível da revelação espírita farão com que venhamos a valorizar o que somos e temos, tornando-nos mais confiantes nas possibilidades da vida, mas, sobretudo nos dará a consciência do tanto que temos a agradecer pelos “talentos” que nos foram concedidos pela Divina Providência para o nosso próprio bem.

Ainda uma última observação. Se aquele jovem cego não precisa de um guia para correr, seja na presença de um ser humano ou um cão treinado, para nós outros, cegos do espírito, concedeu-nos o Criador um amigo incondicional que é o Modelo e Guia da humanidade em marcha. É o Senhor Jesus, e Ele nos alerta “quem me segue não anda em treva” (1) e “Eu vim para que tenham vida, e a tenham em abundância.” (2)

Não percamos tempo. Sigamos com e por Jesus, mas nunca sem Kardec. Será sempre mais fácil enxergar e enfrentar a vida. A nossa própria vida.

Pensemos nisso.

Antonio Carlos Navarro

Referências:

(1) Dias, Haroldo Dutra. O Novo testamento, 1ª ed. Brasília: Conselho Espírita Internacional, 2010. Jo 8:12;
(2) Dias, Haroldo Dutra. O Novo testamento, 1ª ed. Brasília: Conselho Espírita Internacional, 2010. Jo 10:10.

Publicado simultaneamente em www.agendaespiritabrasil.com.br

Originally posted 2014-09-09 19:20:22.